A radioterapia adjuvante (RT) é uma intervenção essencial no tratamento do câncer de mama em estágio inicial. Ela oferece proteção significativa contra a recorrência ipsilateral nos primeiros 10 anos após o tratamento. No entanto, estudos recentes sugerem que esse benefício não se estende além dessa primeira década.
Eficácia da Radioterapia Adjuvante nos Primeiros 10 Anos
Um estudo randomizado, com acompanhamento de 30 anos, revelou que a RT adjuvante reduz em 61% o risco de recorrência ipsilateral. Esse benefício é mais expressivo nos primeiros 10 anos, com uma redução de 76% na taxa de risco (HR). Contudo, após essa primeira década, o risco de recorrência ipsilateral se igualou entre os grupos que receberam e não receberam RT, conforme o estudo liderado por Linda J. Williams, PhD, da Universidade de Edimburgo, e publicado na Lancet Oncology.
Além disso, a sobrevida global (SG) não apresentou diferenças significativas entre os dois grupos. Isso sugere que, embora a RT adjuvante seja eficaz na prevenção da recorrência nos primeiros anos, seu impacto na sobrevivência a longo prazo é questionável.
Implicações Clínicas da Radioterapia no Câncer de Mama
Os resultados do estudo são valiosos para orientar médicos na escolha do uso da RT adjuvante em pacientes com câncer de mama inicial. A descoberta de que a RT não previne recorrências tardias sugere que pacientes com biologia tumoral predisposta a recaídas tardias podem não se beneficiar tanto da RT. Essa teoria, portanto, necessita de investigações adicionais.
O estudo também contribui para a evidência crescente de que a radioterapia pode não ser necessária para todas as pacientes após cirurgia conservadora da mama. No entanto, a identificação precisa dos subgrupos de pacientes que podem evitar a RT com segurança ainda não está clara.
Desafios na Identificação de Pacientes que Podem Evitar a Radioterapia
Um dos maiores desafios é identificar quais pacientes podem ser candidatos à omissão da RT. Apesar de estudos anteriores terem explorado a utilidade de cortes de idade, painéis genéticos e resultados de ressonância magnética, as conclusões ainda são limitadas.
Hans-Christian Kolberg, MD, e Cornelia Kolberg-Liedtke, MD, PhD, em seu comentário sobre o estudo, reforçam que identificar subgrupos de pacientes que podem evitar a radioterapia adjuvante com segurança é um desafio contínuo.
O Scottish Breast Conservation Trial: Um Estudo de Longo Prazo
O Scottish Breast Conservation Trial, iniciado em 1985, foi um dos primeiros a comparar o tratamento conservador da mama com e sem RT adjuvante. Este estudo se destacou por fornecer dados de até 30 anos de seguimento, enquanto a maioria dos estudos anteriores acompanhou pacientes por 5 a 10 anos.
Os participantes do estudo tinham menos de 70 anos e foram diagnosticados com câncer de mama T1/2 N0/1. Todos foram tratados com lumpectomia, amostragem ou remoção de linfonodos, e terapia sistêmica adjuvante. Eles foram randomizados para receber RT local ou locorregional de alta dose (50 Gy em 20-25 frações) ou nenhuma RT. O principal objetivo era avaliar a recorrência ipsilateral.
Resultados e Conclusões do Estudo
Dos 585 pacientes originalmente incluídos no ensaio, 443 morreram até o momento do relatório atual. A análise mostrou que a mediana de sobrevida global foi de 19,2 anos no grupo que recebeu RT e 18,7 anos no grupo sem RT. A taxa de sobrevida global de 30 anos foi de 23,7% no grupo de RT, em comparação com 27,5% no grupo sem RT.
Os autores observaram uma diferença distinta na recorrência ipsilateral ao longo do tempo. Durante os primeiros 10 anos após o tratamento, a RT resultou em uma redução significativa na recorrência ipsilateral (HR 0,24, IC 95% 0,15-0,38, P < 0,001). Após esse período, o risco de recorrência foi quase idêntico entre os grupos (HR 0,98, IC 95% 0,54-1,79).
Este estudo reafirma que a RT adjuvante oferece uma proteção significativa contra a recorrência ipsilateral durante os primeiros 10 anos, mas não além desse período. A RT não mostrou melhorar a sobrevida global, mas é reconfortante que sua omissão não tenha aumentado a taxa de metástase à distância.
Considerações Finais
Este estudo oferece insights importantes para o tratamento do câncer de mama inicial. Sugere que a radioterapia adjuvante deve ser considerada cuidadosamente, com base na biologia individual do tumor e no risco de recorrência precoce. A decisão de omitir a RT deve ser baseada em uma avaliação detalhada de cada caso, levando em conta os benefícios e limitações observados nos primeiros 10 anos de tratamento.
Enquanto a pesquisa continua a evoluir, a identificação precisa de pacientes que podem evitar a RT adjuvante com segurança permanece uma prioridade. Esta abordagem permitirá personalizar ainda mais o tratamento do câncer de mama, focando nas necessidades individuais de cada paciente.
Referência da fonte: www.medpagetoday.com